sábado, 27 de junho de 2009

PAPA FIGO


- Pô mãe, deixa eu sair eu nunca mais vi os caras daqui da rua.
- Negativo meu filho.
- Pô mãe, deixa aí vai.
- Não é não e pronto. Enquanto você não me mostrar o boletim com tudo aprovado, você vai ficar aqui de castigo e tem mais, o boato na rua é que o papa-figo está solto.
- Papa-fígo, papa-fígo nem existe - em tom trêmulo
- Então saia para você ver o que vaia contecer contigo, depois não diga que não avisei. Eulina tia de Fabrizio, estava contando hoje lá na escola que um rapaizinho filho de sua secretária tinha sumido, Já tinha uns 3 dias que ele não voltava pra casa.
- Sério mainha. - pasmo.
- Seríssimo, agora pegue o romance da 4° unidade e vá ler.
Depois dessa triste e comovente notícia corri para falar com minha irmã. Exibindo a ela todos os detalhes da conversa que tive com minha mãe. Ela com o olho de coruja em cima de mim, com muito medo foi perguntar a mainha se era verdade, não deu outra voltou mais medrosa que tudo. Daí em diante a rua onde morávamos era totalmente outra. Contei o caso para Paulo Berimbau, Dido, Long, Vanzinho, Sêco, Dilmar, Pipo, Melão e Andrezinho, tinha mais gente mas o medo era tão grande que nem lembro direito quem estava presente naquele dia. Sei que foi saindo uma a um, a rua que era o centro de encontro da gente a noite estava morta e sombria. Não via se quer um pé de moleque alí, sem falar em Marta,Patrícia, Ana e Cris, amigas de minha irmã, que souberam do tal Papa através dela.
Um tempo depois voltamos a nos unir, coincidentemente após a última unidade da escola.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

PALMO A CACETE

... uma leitina vale duas, você quer trocar ? – disse Mica
- Porra nenhuma Bico de Combi, você fica com esse zoião em cima da minha lata. Se quiser vai ter que jogar – retrucou Long, escondendo a lata de leite cheia até o talo de gude verde.
- Palmo a cacete, triângulo ou buraco – Mica desafiando Long
- Palmo a cacete – confirmou Long.
O sol estava de lascar, a farda da escola ainda presente no corpo, mochila presa nas costas e a fome não era de almoçar e sim de jogar. Depois de duas horas de jogo, Long estava fubilado, Mica rapou quase tudo, restando apenas umas 6 esferas, 2 carambolas e 4 leitina, sendo uma dedeira.
O jogo foi interrompido por um grito estérico de dona Lurdes ,a mãe de Long. “ mas que diabo Marquinhos, já chamei mais de mil vezes , almoçar seu porra”. O chavão passou batido aos ouvidos dos jogadores, principalmente ele que já perdia no mínimo umas 53 gudes. Mica em tom irônico ascende o chamado:
- Marcos, sua mãe está chamando.
- Que nada Mica jogue logo, tá com medo de continuar diga. – disse Marquinho
- Depois não diga não avisei, tome lá pague logo- Riu baixo Bico de Combi.Já nas últimas Long se desespera e aposta tudo com Mica, e mudam o estilo do jogo , vão para o triângulo. Nem mau começou a partida, Marcos toma uma sapecada no meio do cangote, Dona Lurde acerta em cheio o seu filho jogador, não dando tempo se quer de uma esquiva. Mica que não era bobo, bateu poeira rapou as gudes todas do triânguloe zarpou pra casa. Marquinho saiu chorando seguro pelos braços por sua mãe, sem gude e com o pescoço vermelho, que nem cangote de galo POLACO

domingo, 21 de junho de 2009

A radiola de Damasceno



Na radiola girava em rotação 45 Tábua de Esmeralda, Jorge Bem. E pronto pra ser tocado, preso ao pino central do toca disco Circus, Rolling Stones 1968. Em cima da mesa 2 pães de sal, um quente frio azul, uma xícara de café tipo duralex e um março de cigarro. E no canto da cozinha, perto da fruteira que naquele momento tinha apenas uma banana preta sendo devorada pelos mosquitos cú-de-cahorro, o plástico incolor, que vestia os vinis antes de colocar na capa principal.
Era um domingo que na verdade parecia uma segunda, o tempo não ajudava, muita chuva e o sol escabreado não dava trela aos amantes do primeiro dia da semana. Esbarravam aos vidros das janelas e escorregavam tipo tobogã as gotas d´agua emitida por Deus, ao mesmo tempo fazia fundo com o som que rolava na velha e amiga vitrola. O telefone, o telefone só do vizinho que na verdade era um velhinha de 78 anos que pra fazer uma ligação tinha que embolsá-la 8 cruzeiros, velhinha escrota ! Sandália de dedo já nas últimas, bermuda jeans US TOP e uma camisa preta bem gasta do Kiss, assim era Damasceno, o das antigas.
Depois de 2 horas esperando chegam os amigos do Dama, como era conhecido. Traziam cervejas, cervejas, cigarros, cigarros e mais cervejas e cigarros. Muito som, regado a álcool, fumaças e papos sobre putas. Assim era a vida de Damasceno Constantino Santos Neto.


Radiola modelo 1506 V, ano 1950 , Sweden (http://www.johansoldradios.se/radiograms/radiola-1506-v )

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A Dama de Azul



Não sabia ela que a sua beleza era realmente estonteante, os seus cabelos lisos feitos fios de retroz, a sua cor aparecia no cenário como algo não definido e a sua pureza d´alma penetrava aos olhos dos homens brutos. Ao seu copo longilíneo, um vestido longo azul turquesa, pés no chão e feição de anjo derrotado. As lágrimas banhavam seus rubis oculares, mãos trêmulas e gélidas e passos de lebre em fuga das balas sanguinária do caçador ordinário.
O cenário era pulcro, mas a situação era pobre, não podia imaginar que o mundo conspirava contra toda a sua vida. A pequena Lady no país dos pestes sofria segundo a segundo, sofria,sofria , sofria...Nada claro ficou aos curiosos letreiros, não era amor nem se quer dinheiro, sua saúde estava intacta e sua família abençoada. Diante o abismo das grandes rochas recitou um pequeno poema ao seu Deus:
Leva-me como trouxe
Perdoa os meus pecados
As asas que pôs em mim
Depena e atira ao fogo
Estou presa ao inconformismo
Estou lúcida da verdade
Sagaz foi meu castigo
Que entrego a realidade
Atirando o seu corpo ao infinito despenca sem aterrissagem, a pequena Lady-Alada não consegue mais voar, o seu fim chegou de forma brusca e impiedosa.

O quadro Dama de Azul, pintado por Maria Helena Castro